quinta-feira, 4 de outubro de 2018

QUAL O PAPEL DAS MICAS (MUSCOVITA) NOS FERROS DE PASSAR ROUPAS ANTIGOS?

WHAT IS THE ROLE OF MICAS (MUSCOVITA) IN IRONING OF OLD CLOTHING?
  • Qual o papel das micas nos ferros de passar roupas antigos?
  • 2  Quais as propriedades destes minerais que os tornam úteis para tais fins?
  • 3.  Por qual material esse mineral foi substituído nos ferros de passar modernos?

As micas, como a muscovita, biotita, lepidolita, fuchsita, entre outras, pertencem a um grupo de minerais silicatados (os filossilicatos, do grego φύλλον phyllon, folha) cuja estrutura possibilita a obtenção de finas lâminas, as quais apresentam propriedades térmicas, ópticas e elétricas apropriadas para usos em equipamentos eletroeletrônicos, elétricos e térmicos.
Um desses usos é o emprego de lâminas finas de muscovita na estrutura responsável pelo aquecimento dos ferros de passar roupas mais antigos. A muscovita, como as outras micas, apresentam propriedades térmicas como, alto ponto de fusão (temperatura a partir da qual um sólido começa a derreter), em torno de 600ºC [1]; baixa condutividade térmica (0,7 W/mK)[2], em comparação, por exemplo, com o diamante (1000 W/mK )[2] e o cobre (90..400 W/mK)[2], esse ultimo conhecido bom condutor de calor. Isso porque quando aquecida, o calor demora muito para se espalhar ao longo de sua estrutura, ou seja, a energia fornecida em forma de calor quase que fica somente no local onde o aquecimento ocorreu, isolando o calor fornecido naquela região, sendo, portanto, um isolante térmico, diferente dos metais, como o cobre citado acima, ou o alumínio em uma panela que, quando segurada pelo cabo e aquecida, logo se percebe o calor chegando nas mãos. Exibe também propriedades elétricas como dieletricidade (é um isolante elétrico, ou seja, a “força elétrica” (voltagem necessária para fazer a mica conduzir eletricidade (romper essa rigidez dielétrica) é de cerca de (118.000 volts/1 centímetro de espessura de mica [3]), ou seja, em aplicações usuais, a mica é um ótimo isolante elétrico, o que implica que ela tem uma alta resistência a passagem de eletricidade em sua estrutura (alta resistência elétrica).
No caso dos ferros de passar roupas antigos, a mica atua não como o resistor (o responsável por converter energia elétrica em energia térmica (efeito Joule)) mas sim como um radiador dessa energia convertida por um filamento metálico (imagem 1), comumente, de níquel-cromo (o mesmo utilizado nos secadores de cabelos e nas resistências de chuveiros). Esse radiador de calor gerado pelo filamento, distribuí a energia térmica para o ferro de passar não somente por condução( pelo contato direto da muscovita com a carcaça do ferro), mas principalmente por radiação (as micas são boas radiadoras de calor, com coeficiente de emissividade igual a 0,75 [4], sendo os materiais mais emissivos tendo valores máximos próximos de 1), além de isolar o filamento do restante da carcaça do aparelho.

Figura 1 - Resistência de Mica de um ferro de passar

            Vale lembrar que o calor se propaga por três modos: condução (onde há o contato direto do corpo quente com o corpo frio), por convecção (onde a transferência da energia térmica se dá pelo deslocamento de massas de algum fluido, líquido ou gás, saído de uma região fria para uma mais quente e, com isso, transferido calor para sua vizinhança nesse trajeto) e por radiação, onde a energia se propaga por meio de ondas eletromagnéticas com propriedades específicas, as quais possibilitam essas ondas interagirem com a matéria e transferirem sua energia em forma de calor. Quando mencionado que as micas possuem baixa condutividade térmica, estava referindo a baixa condutividade térmica para a transferência de calor por condução. No ferro de passar a mica transfere esse calor gerado pelo filamento principalmente  por radiação (há transferência por condução na região de  contato com o filamento também), ou seja, o filamento aquece a uma temperatura que o faz emitir ondas eletromagnéticas na região do infravermelho (com comprimentos de onda associados a temperatura do filamento) e a mica absorve essas “ondas de calor” e as reemite, de forma estável e uniforme ao logo de sua estrutura (ponto principal que justifica seu uso, além do isolamento), para todas as direções, e essas ondas interagem com a carcaça do ferro de passar e o aquece, sem que haja o contato direto, transferindo o calor para ele e elevando sua temperatura.
 Mas porque ao invés de usar a mica não colocar o filamento aquecido pela passagem da corrente elétrica diretamente em contato com a superfície de aquecimento do ferro de passar? A resposta é simples, isso poderia causar um choque em quem manuseia o aparelho, tendo em vista que, caso ele tocasse sobre sua parte metálica, que por sua vez estaria em contato com o fio que é percorrido por eletricidade, faria com que essa eletricidade viesse a passar pelo seu corpo, produzindo contrações musculares, o famoso choque elétrico. Portanto as micas têm um segundo papel importante nessa história, isolar eletricamente o filamento do resto do equipamento, evitando possíveis choques.
Os ferros modernos mais simples usam como elemento de aquecimento ainda um filamento de uma liga metálica mas como radiador, não mais a mica, mas sim materiais com propriedades semelhantes, como algumas cerâmicas.  Procurem na internet sobre heating elements e também por Micathermic heater.
Das micas, a muscovita é a mais utilizada, principalmente devido a sua maior estabilidade química nas condições ambientes (por exemplo, a biotita se intemperiza muita mais rapidamente nas condições normais de pressão e temperatura, principalmente por ter em sua constituição o ferro, que se oxida facilmente, mudando a estrutura do mineral e o modificando (intemperizando)).  A muscovita é empregada em várias outras aplicações, dentre elas, o seu uso na eletrônica em  válvulas termoiônicas e em capacitores elétricos, onde atuam com isolantes elétricos dos terminais das válvulas e das placas dos capacitores, respectivamente. Em contadores Geiger (medidores de radiação ionizante) a muscovita é usada com janela para passagem da radiação alfa para dentro do tudo detector, cujo interior é de um vácuo de gás e a mica tem o papel de manter esse vácuo e deixar as partículas entrarem, pois outros materiais, como o alumínio, por exemplo, manteria o vácuo no tubo mas não deixaria as partículas entrarem. Na óptica. utiliza-se a muscovita em polarizadores de luz visível, devido a sua estrutura possibilitar o fenômeno da birrefringência nessa região do espectro eletromagnético.

#Em breve postarei aqui alguns experimentos sobre a birrefringência da muscovita e de um outro mineral opticamente especial, a calcita. 

Wenderson Rodrigues Fialho da Silva – Viçosa, 16 de julho de 2018



[1] http://hyperphysics.phy-astr.gsu.edu/hbase/Geophys/meltrock.html                                                    [2] http://www.universal-science.com/wp-content/uploads/2012/08/Thermal-conductivity-table.pdf                                                                                                                                                                [3] https://en.wikipedia.org/wiki/Dielectric_strength#cite_note-CRC-6                                                        [4] https://www.omega.com/temperature/z/pdf/z088-089.pdf

                                                                                                        

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